Talvez não sejamos o país mais desonesto do mundo, mas não há dúvida de que a desonestidade é tão endêmica entre os brasileiros que os casos mais simples simplesmente são encarados com tamanha naturalidade que nem mesmo nós os consideramos como ato de levar vantagem sobre o outro. Este é o caso daquele que fura uma fila seja onde for. Mesmo que o espertinho chegue para a pessoa na frente da qual deseja entrar e peça para passar à frente, isso não tira a desonestidade de seu ato. E mesmo que ele argumente que fulano o deixou passar á frente, a fila não é composta dessas duas pessoas. Ao passar na frente de alguém numa fila, a pessoa está passando na frente de todas aquelas que estão na fila, ou seja: levando vantagem sobre todas elas. De forma que, se ele está pedindo permissão para passar na frente, terá de pedi-la não só àquele do qual entrou na frente mas a todos os demais. Como ninguém faz isso, a pessoa acaba não só agindo com esperteza como também sem o menor respeito para com todos que estão na fila. Portanto, aquele que fura uma fila, incorre em dois atos moralmente condenáveis: falta de caráter e desprezo pelo próximo. Embora o fato de furar uma fila não quer dizer que a pessoa que o fez seja de fato uma pessoa má, mostra, por um lado, que se trata de alguém que, diante de uma oportunidade de levar vantagem sobre o seu semelhante, mesmo que esta venha prejudicar outros, não pensará duas vezes, pois o caráter de uma pessoa se mede nos menores atos. Por outro lado, o fato de as pessoas que estão na fila aceitarem tal coisa, o que de fato ocorre na maioria das vezes, acaba não só reforçando a desonestidade daquele que a praticou como mostrando que a desonestidade é tolerada e que não há nenhum mal em praticá-la. Dai o tão famoso e conhecido mundialmente “jeitinho brasileiro”, onde muitas vezes se age não no sentido de simplificar e melhorar o sistema jurídico mas sim de encontrar meios de burlá-lo. Um povo honesto e de caráter não precisa de tantas leis. Talvez por isso sejamos um dos países onde há mais leis. E ainda sim estas são insuficientes. Enfim, nós, os brasileiros, até podemos ser um povo alegre, festivo e muito receptivo, mas somos antes de tudo um povo que despreza o bom senso, o caráter e respeito pelo próximo. Talvez nunca venhamos a ser de fato um povo decente. Só espero que eu esteja errado.